Esta carta é destinada à você, mãe, que acabou de ouvir do seu filho (ou filha) “mãe, estou pensando em ir viajar…”. Se você está preocupada, desesperada ou em estado de choque, eu espero que a carta abaixo possa te ajudar de alguma forma!
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Querida mãe,
Lá estava você tranquila, chegando do trabalho, ou sentada no sofá assistindo televisão, quando seu filho (ou filha) se aproximou de você com um ar meio nervoso, meio agitado:
“ô mãe…” ele disse, “estou pensando em ir viajar…”
Seu coração já para. Você finge procurar algo na sua bolsa (ou troca de canal na televisão), e pergunta como se não estivesse muito interessada:
“para onde, meu filho?”
“não sei mãe, algum lugar do mundo… talvez um mochilão na Europa…”
Agora seu coração parou de vez. Você quase deixa a bolsa (ou o controle remoto) cair no chão. A coisa é séria, e você sente que é melhor dar atenção antes que o filho resolva tocar a ideia pra frente.
Não se preocupe, eu sei como você está se sentindo, eu já vi muitas e muitas mães passarem por isso (pois em verdade na maioria das vezes eu mesma sou a culpada em dar essa ideia para o filho delas).
A ordem do que acontece depois é mais ou menos a seguinte:
Depois do seu estado de choque onde você fica alguns segundos sem saber direito o que dizer, você começa a querer tirar satisfação com seu filho, tentando entender como ele veio sequer a começar a pensar neste assunto.
Você faz pergunta atrás de pergunta:
Mas de onde veio essa idéia? Você vai sozinho? Quanto tempo? E o trabalho!? E os estudos!!? Por que Europa? O que tem lá? Você já pesquisou se é seguro fazer isso? Por que mochilão? Por que você não contrata uma agência de turismo? Precisa ser fora do Brasil? Quem te pôs isso na cabeça, foi o João?
Depois de (não) ouvir nenhuma das respostas que seu filho te deu, você começa a entrar em desespero. Meu Deus, você pensa, meu filho sozinho no mundo? Mas o mundo é muito grande! Muito pergioso! E se acontece alguma coisa? E se ele cai e quebra a perna no meio da floresta? Minha Nossa Senhora…
Então todas as cenas de terror de todos os filmes que você já assistiu começam a vir em sua mente. Você entra em desespero absoluto, e começa a contar para o filho todas essas histórias de terror, a dizer como o mundo é muito perigoso, como é caro viajar, como ele não vai conseguir fazer tudo sozinho.
Infelizmente, é aqui que acaba o sonho de muita gente que já pensou em ir viajar.
Vou te contar o que está acontecendo com seu filho para você poder entendê-lo melhor (pois às vezes é mais fácil alguém de fora explicar do que ele próprio).
Primeiramente, não tenha dúvidas, todas essas perguntas e incertezas estão também no coração do seu filho. Ele também está com medo, com receio se vai dar certo, com dúvida se consegue fazer isso sozinho.
Posso te garantir também que ele não tomou essa decisão de uma hora para a outra, e o fato dele estar trazendo isso para você foi seu primeiro grande ato de coragem, seu primeiro passo para poder realizar a sua viagem.
Desde a primeira vez que ele ouviu falar de alguém que havia viajado o mundo com uma mochila nas costas, ele provavelmente já passou algumas noites em claro, sonhando acordado, assim como também passou os últimos dias ou meses viajando na mente, imaginando se ele também seria capaz de fazer aquilo. Se perguntando: será que é possível? Será que eu também posso?
Ele então pesquisou muito, e encontrou vários blogs com histórias de pessoas comuns que fizeram exatamente o que ele quer fazer: viajar pelo mundo. Ele encontrou várias dicas de como viajar barato, como viajar com segurança, os melhores destinos para se viajar pela primeira vez, e leu alguns (ou vários) posts que lhe diziam para confiar em seus instintos e sair para o mundo.
Com um fio de esperança que agora iluminava uma fresta de sua mente, ele começou a se perguntar algo que ele nunca tinha seriamente se perguntado antes: se eu posso viajar para qualquer lugar, para onde eu gostaria de ir?
Este foi provavelmente um momento de muita reflexão para ele.
Afinal, para decidir para onde se quer ir é necessário antes saber do que você gosta ou não gosta de fazer, o que você aprecia ou não aprecia em uma cultura ou país, quais são seus valores, seus preconceitos, seus interesses, seus talentos, seu nível de auto-confiança ou independência, seus limites, suas crenças, seus medos, suas clarezas…
Contudo, para saber de tudo isso, é preciso se conhecer muito bem, e se conhecer muito bem infelizmente não é o caso da maioria das pessoas da sociedade de hoje.
Seu filho provavelmente percebeu então que não se conhece.
E isso o assustou.
Ele então provavelmente intuiu, como muitos outros antes dele, que para se conhecer melhor ele deveria se colocar em movimento em algum tipo de jornada, não importando muito o destino. Uma coisa era certa: as coisas não poderiam continuar sendo as mesmas.
Para a sorte do seu filho, por uma grande ironia divina, um dos melhores jeitos de se conhecer, é sair para conhecer o mundo.
Por quê?
Porque é somente quando você sai de sua zona de conforto e se coloca em movimento no mundo, que você percebe quais são seus limites (e principalmente percebe que você é capaz de ultrapassá-los). É somente vivendo outras culturas que você pode encarar seus preconceitos; somente se deparando com outras religiões que você encontra suas crenças; somente enfrentando seus medos que você descobre sua coragem.
E essas são coisas muito importantes de serem descobertas.
Porém, essas não são as únicas coisas que seu filho vai aprender na sua viagem (apesar dele não saber disso ainda).
Ele vai poder também experenciar coisas que não são tão comuns de se experenciar no dia-a-dia.
Ele vai viver na pele a compaixão ao ser ajudado por um completo estranho, e depois disso, a gratidão e a compreensão da frase gentileza gera gentileza. Ele vai aprender sobre o desapego ao viver com somente o necessário, e a viver o presente ao admirar uma linda paisagem (e não ter mais nada para fazer naquele dia senão admirá-la). Ele vai encontrar a felicidade nas pequenas coisas, como ter um chuveiro quente, ter como lavar sua roupa, ou ter um travesseiro de verdade para dormir. Ele vai descobrir também que felicidade não tem nada a ver com dinheiro.
Ele vai descobrir o verdadeiro sentido da liberdade ao acordar de manhã e saber que ele tem o poder de decidir ir onde quiser ir, e fazer o que quiser fazer. Ele vai se perguntar coisas que ele nunca imaginou que se perguntaria, como por exemplo: “como será que a lua se parece aqui do outro lado do mundo, será que dá pra ver o coelho nela?”.
Ele vai descobrir que o mundo é bom e que existem muitas pessoas boas no mundo.
E é por causa de todas essas coisas, querida mãe, que você pode ficar tranquila. Neste mundo existe muito mais amor do que maldade, muito mais felicidade do que tristeza, e muito mais generosidade do que egoísmo. Acredite, eu vi isso com meus próprios olhos. Deixe seu filho descobrir isso por ele próprio também.
Deixe seu filho descobrir tudo isso por ele próprio.
Deixe que ele viva e que ele aprenda com a vida. Deixe que ele vá viajar para onde sentir que seu coração está dizendo para ele ir viajar. Vai dar tudo certo. Ele provavelmente irá aprender mais sobre a vida e sobre si mesmo em um mês de viagem do que em uma vida inteira.
A faculdade? O trabalho? São parte da vida, mas não são a única parte, nem a parte mais importante. Deixe que seu filho vá descobrir o que realmente o faz feliz.
Deixe que ele se perca para poder depois se encontrar.
Deixe que ele tenha perguntas (muitas perguntas!) e deixe e que as perguntas o guiem, ao invés das respostas.
Confie que vai dar tudo certo, porque vai sim dar tudo certo!
Se você ainda estiver preocupada com segurança, você pode sentar-se junto com seu filho e ajudá-lo a pesquisar tudo sobre o país que ele está pensando em ir. Vocês podem escolher um país que seja fácil e seguro para se ir viajar pela primeira vez (por exemplo Canadá ou qualquer país da Europa Ocidental), e optar por uma viagem onde ele possa ficar fixo em um lugar só (por exemplo um trabalho voluntário em algum lugar remoto da itália, ou em um templo budista no Japão).
Lembre-se: essa pode ser a decisão mais importante da vida do seu filho, um tempo na vida dele onde ele poderá ter seus maiores insights e viver suas maiores lições de vida. Ele precisa do seu apoio, do seu porto seguro. Apoie-o!
Confie na intuição dele. De uma forma ou de outra, esta viagem é exatamente o que ele está precisando no momento. Deixe que ele vá em busca de se conhecer e se transformar para o melhor.
Você nem imagina a transformação que seu filho vai ter. Tenho certeza que você vai se orgulhar dele!
Com muito amor,
Uma viajante.
Obs. Se você quiser, você pode ler também este post sobre qual a melhor idade para ir viajar, talvez te ajude a ficar mais tranquila quanto a idade do seu filho 🙂